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08 | Abr

O IMPACTO DO CORONAVÍRUS NOS CONTRATOS INTERNACIONAIS – O QUE ESPERAR

Um impacto sem precedentes atinge a economia internacional em diversos setores como indústria, comércio e turismo.

O IMPACTO DO CORONAVÍRUS NOS CONTRATOS INTERNACIONAIS – O QUE ESPERAR

Um dos reflexos mais latentes que indicam o abalo na economia mundial em virtude do COVID-19 é a necessidade de revisitar inúmeros contratos internacionais, especialmente de compra e venda de mercadorias e insumos que, certamente serão descumpridos – ou cumpridos parcialmente –  seja em virtude de paralisações na cadeia produtiva de suprimentos (supply chain), que impactam exportação de produtos e importação de insumos, ou ainda devido às dificuldades de logística relacionadas ao despacho/embarque, por avião ou mesmo navio, de tais insumos.

Não há como calcular, nesse momento, extensão dos efeitos causados em virtude do atual estado pandêmico mundial na vida das pessoas.  Circunstâncias tão atípicas que, além de afetar os países por ela atingidos em setores sanitários, de saúde, educação e mesmo políticos, têm potencial de causar enorme impacto também nos contratos, nacionais e internacionais.

Sobre o aspecto internacional, a base legal que afetará a maior parte dos contratos relacionados à compra e venda de mercadorias e insumos é a Convenção de Viena sobre Compra e Venda Internacional de Mercadorias (“Convenção”). Não apenas o Brasil é signatário desta Convenção, mas também os seus principais parceiros comerciais, como, por exemplo, os Estados membros do Mercosul, do Nafta, a China e a maioria dos países da União Europeia.

Tendo em vista que a Convenção busca chegar a um denominador comum entre legislações e costumes diversos, ela prevê, no Art. 79, ainda que não haja a tradução oficial para o português, que “uma parte não será responsável pelo não cumprimento de nenhuma das suas obrigações se provar que o não cumprimento é devido a um impedimento fora de seu controle e se não fosse razoavelmente esperado que levou em consideração o impedimento no momento da celebração do contrato”.

O texto desse dispositivo dá a entender que são consideradas as hipóteses em que fatos além do controle das partes impossibilitam a performance, independentemente das definições contratuais ou advindas da legislação dos países das partes contratantes, e que faz concluir, assim, que as consequências do Coronavírus em tais circunstâncias funcionariam como caso fortuito/força maior – em contratos internacionais usualmente classificados como force majeure – capazes de relativizar, ou mesmo isentar responsabilidades.

Por exemplo, a redução, ou mesmo a paralisação de uma operação de fábrica, por conta de uma determinação legal/governamental, ou por decisão da própria administração da empresa, visando a segurança e o bem estar de seus colaboradores, implica diretamente na falta de abastecimento daquele insumo, ou na diminuição considerável de sua disponibilidade. Por consequência, diversos outros negócios que dependem de tal insumo poderiam incorrer em descumprimento contratual, e tal descumprimento acaba por repercutir na cadeia de suprimentos como um todo.

Independentemente do país, o contrato costuma prever as consequências de seu descumprimento, e no cenário internacional estes podem conter diversas previsões, e se sujeitar a uma diversidade de legislações distintas aplicáveis, que podem, consequentemente, mudar a interpretação dos respectivos direitos e deveres das partes. Não obstante a isso, existe a capacidade das partes buscarem, de comum acordo e previamente a esse estágio, através de discussões, renúncias e comprometimento mútuo, celebrando-se, por fim, um aditivo contratual.

Não obstante, ainda que haja a previsão de force majeure, se faz necessário comprovar o nexo causal entre o impacto causado pela pandemia do Coronavírus e o descumprimento – ou cumprimento parcial – da obrigação contratual, tendo em mente as peculiaridades de cada contrato e de cada parte, de maneira que a simples alegação, sem qualquer tipo de correlação ou justificativa plausível não poderá ser considerada como suficiente para os efeitos decorrentes da instituição do evento.

Se faz imprescindível analisar cada relação contratual, compreendendo suas cláusulas e o contexto o qual as partes estão inseridas: se, diante da pandemia, realmente não há a possibilidade de cumprimento da obrigação (ou apenas de cumprimento parcial), se houve excessiva onerosidade para o adimplemento das obrigações de uma das partes, dentre outras hipóteses que podem ser verificadas através da análise de cada caso em concreto.

O cenário atual é incerto, e causa, com isso, um temor acerca das repercussões econômicas, relacionadas desde fluxos de caixa a até a insolvência das empresas.

No que tange aos contratos que serão celebrados durante a pandemia, recomenda-se, que tais instrumentos prevejam, expressamente, mecanismos para declaração de force majeure, e, inclusive o procedimento de comunicação entre partes, prazos, e previsões acerca de renegociação e suspensão, além de ajustar, se possível, eventuais soluções que poderão ser implementadas, a fim de mitigar, na medida do possível, situações de impasses ou mesmos riscos à realização do negócio.

Nos próximos meses, o que se sugere é cautela, no cumprimento das obrigações contratuais possíveis, o bom relacionamento e a transparência entre as partes, e, decerto, a disponibilidade para revisão e renegociação de cláusulas contratuais, baseando-se no princípio da boa-fé, diante das impossibilidades que possam surgir.

 

Por Gabrielle Costa. E-mail: empresarial@mellopimentel.com.br